IBS e CBS na prática: o que muda no cálculo, nos créditos e nas decisões estratégicas das empresas
A Reforma Tributária do Consumo (EC 132/2023 e LC 214/2025) inaugura um novo capítulo para o ambiente de negócios no Brasil. Saem PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS; entram a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), em um desenho de IVA Dual que promete simplificação, incidência destacada em nota fiscal e creditamento amplo. Some-se a isso o split payment — o recolhimento automático do tributo no pagamento da nota — e o resultado é um sistema que reorganiza preços, contratos, fluxo de caixa e estrutura operacional.
Transição: quando cada mudança acontece
2026 — Fase piloto
Alíquotas simbólicas (CBS 0,9% e IBS 0,1%) para testar arrecadação, escrituração e repasses. Empresas devem ajustar ERP, emissores de NF e cadastros.
2027 a 2032 — Convivência de modelos
O sistema atual perde peso gradualmente enquanto IBS/CBS sobem. É o período de maior complexidade: dois sistemas em paralelo, exigindo controles para não perder créditos nem pagar em duplicidade.
A partir de 2033 — Consolidação
Extinção de PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS. IBS e CBS tornam-se os tributos sobre consumo, com alíquota de referência em torno de 26,5% (ajustável por regimes setoriais).
Incidência destacada: transparência na formação do preço
O novo sistema rompe com a “carga invisível” do imposto embutido. IBS e CBS aparecem destacados na nota, não compõem a base de si mesmos nem a do outro, e evidenciam para o cliente o que é preço e o que é tributo.
Exemplo comparativo (com PIS/Cofins no cenário atual):
- Hoje (embutido): um produto vendido por R$ 100,00 já carrega, de forma pouco visível, cerca de R$ 27,25 em ICMS (18%) + PIS/Cofins (9,25%).
- Novo (destacado): R$ 100,00 é o valor líquido da operação; IBS+CBS (26,5%) aparece separado na NF (R$ 26,50). Total ao cliente: R$ 126,50 — com o tributo claramente evidenciado.
Crédito tributário: onde mora a eficiência
A não cumulatividade ampla é o coração da Reforma. Geram crédito: insumos diretos/indiretos, serviços terceirizados, energia/água/telecom, aluguéis operacionais e ativo imobilizado (com crédito integral na aquisição). Não geram crédito: folha de salários e encargos, pró-labore, distribuição de lucros e despesas sem nexo com a atividade.
Exportações seguem com alíquota zero e devolução/compensação mais célere de créditos. Quando o fornecedor é do Simples, o crédito do comprador existe, mas é proporcional ao imposto efetivamente pago naquele regime.
Terceirização sob nova lógica econômica
Serviços terceirizados geram crédito; salários próprios, não. Isso pode tornar mais vantajosas, fora da folha, atividades de suporte (manutenção, limpeza, segurança, TI, backoffice) sem tocar o core competitivo.
Exemplo: matéria-prima R$ 50.000 + manutenção terceirizada R$ 10.000 + energia R$ 5.000 → créditos R$ 16.975 (26,5%). Com equipe própria, não há crédito sobre salários — e a eficiência cai.
Creditamento e split payment: segurança e previsibilidade
Creditamento (comprador): o crédito nasce automaticamente no momento da operação (nota + pagamento) e não depende do recolhimento pelo fornecedor.
Split payment (recolhimento): ao pagar a NF, o sistema bancário separa IBS/CBS e envia direto ao fisco; o fornecedor recebe apenas o líquido.
Efeitos: fim do risco de glosa do crédito por inadimplência do fornecedor; previsibilidade; menos capital de giro imobilizado; arrecadação em tempo real.
Exemplo: NF de R$ 10.000,00 (+ 26,5%) → R$ 2.650,00 vão ao fisco; R$ 10.000,00 ao fornecedor; o comprador reconhece crédito de R$ 2.650,00 no ato.
Renegociação com fornecedores: o que muda e como conduzir
A transição para IBS/CBS altera a economia da cadeia e a engenharia contratual. Renegociar é essencial para capturar créditos, evitar glosas e ajustar o fluxo de caixa.
Por que renegociar
- Incidência destacada e base de preço — Padronize cotações por preço líquido + IBS/CBS destacados; compare fornecedores pelo valor líquido.
- Créditos e elegibilidade — Seu crédito depende de NF correta (NCM/NBS, natureza, CFOP/NBS, alíquotas). Compras de fornecedores do Simples geram crédito proporcional: inclua isso no TCO.
- Split payment e caixa — O imposto não passa pelo caixa do fornecedor, que recebe só o líquido. Recalibre prazos/preços considerando o novo perfil de capital de giro.
O que alinhar em contrato
- Formatação de propostas: sempre preço líquido + tributos destacados (IBS/CBS e, quando aplicável, IS).
- Governança fiscal: obrigação de emitir NF correta; envio de XML e eventos (carta de correção, cancelamento); integração EDI/ERP.
- Ajustes formais: prazos e formato para nota de crédito/débito em devoluções, descontos posteriores, erros de alíquota.
- Responsabilidades: SLA para correções e indenização por perda/glosa de crédito causada pelo fornecedor.
- Reajustes: cláusulas de repasse transparente quando houver mudança regulatória que altere alíquotas/bases/regimes.
- Qualificação: priorizar fornecedores com maturidade fiscal e tecnológica (menos retrabalho, menos custo de compliance).
KPIs para compras
% de notas com crédito aproveitado; tempo de correção de NF; mix de compras (regime normal vs. Simples); impacto do crédito no TCO por categoria; glosas = 0.
Notas de crédito e de débito: o trilho oficial dos ajustes
Mudou a base após a operação? A regularização é documental para preservar a cadeia de créditos:
- Nota de crédito (corrige para menos): devoluções/cancelamentos, descontos condicionais/bonificações pós-venda, redução de preço.
- Nota de débito (corrige para mais): erro de alíquota/omissão, complementação em operações complexas, reclassificação fiscal.
Depois da venda: o que entra (e o que não entra) na base
- Juros de mora (atraso): natureza financeira → fora da base e sem crédito.
- Descontos incondicionais (na emissão): reduzem a base imediatamente.
- Descontos condicionais/bonificações (pós-venda): nota de crédito.
- Devoluções: nota de crédito para estornar o tributo.
- Receitas financeiras (variação cambial, aplicações, juros): não sofrem IBS/CBS.
Regimes com redução de carga
- –60%: saúde, educação, higiene/limpeza básica, insumos agropecuários, cesta básica e serviços profissionais.
- –40%: bares, restaurantes, hotelaria, turismo, parques, transporte turístico.
- –99%: transporte coletivo ferroviário/metroviário/hidroviário urbano/metropolitano.
- Alíquota zero/isenção: transporte público urbano/rodoviário metropolitano, medicamentos e cesta básica ampliada.
Empresas com operações mistas devem segregar itens e receitas para não diluir benefícios.
Imposto Seletivo (IS): mapeie nos cadastros
O IS incide sobre bens/serviços com externalidades negativas específicas. Corre em paralelo ao IBS/CBS e não gera crédito — exige atenção em cadastro, precificação e comunicação.
Como a Reali transforma a Reforma em oportunidade
A Reforma não muda só o recolhimento; reconfigura processos, sistemas e relações com fornecedores e clientes. Erros de cadastro ou emissão significam perda de crédito, mais caixa consumido e risco de autuação.
A Reali Consultoria atua ponta a ponta:
- Análise tributária de produtos/serviços (NCM/NBS, CST-IBS/CBS, regimes especiais);
- Regras fiscais e creditamento (motor fiscal para débitos/créditos corretos);
- Parametrização de ERP e emissores (NF-e, NFS-e, NFC-e, CT-e; integrações contábeis e relatórios);
- Planejamento de créditos (simulações entre o modelo atual e o novo; governança de aproveitamento; impacto em precificação e margem).
Conclusão
Com incidência destacada, crédito amplo, split payment e um trilho claro para ajustes (notas de crédito/débito), o novo sistema é mais previsível e amigável à eficiência — para quem se prepara.
Quem renegociar fornecedores, ajustar sistemas, rever contratos e repensar a terceirização onde fizer sentido tende a pagar menos na prática, com mais segurança e controle de caixa na nova economia do consumo.
SOBRE O AUTOR
Arlei dos Santos é CEO da Reali e especialista em consultoria empresarial, Arlei ajuda empresas a alcançar novos patamares através de soluções inovadoras e eficazes.
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